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terça-feira, 11 de outubro de 2011

Obrigações afetivas e Lealdades invisíveis

Em 19 de setembro corrente, li um texto bastante contundente intitulado "Protocolos do afeto" na Folha de SP de autoria de Luiz Felipe Pondé. Guardei-o desde então, com o intuito de comentá-lo, posto ser um ponto de vista tão interessante quanto polêmico dependendo das crenças e valores envolvidos em sua análise. O autor começa o texto com a seguinte afirmação: "Famílias podem ser máquinas de moer gente. Uma das marcas de nossa fragilidade é depender monstruosamente de laços tão determinantes e ao mesmo tempo tão acidentais. O acaso de um orgasmo nos une. Em meio a jantares e almoços intermináveis, o horror escorre invisível por entre os corpos à mesa. Talvez muitos pais não amem seus filhos e vice-versa. Quem sabe, parte do trabalho da civilização seja esconder esses demônios da dúvida sob o manto de protocolos cotidianos de afeto" e por aí vai o texto falando de algo que poucos ousam questionar pelo menos abertamente, sobre a obrigatoriedade do amor entre pessoas de uma mesma familia. O fato é que, a verdade de cada um, seja velada ou não, com relação aos próprios sentimentos e sofrimentos oriundos de nossas inserções familiares, é deixada na melhor das hipóteses para ser revelada entre as 4 paredes dos nossos consultórios e na pior delas na forma dos atos violentos intra-famílias que vemos diariamente por aí nos noticiários policiais. Digo isso porque, dias antes de ler esse texto, havia saído de um atendimento com o sentimento de ter possibilitado a ressignificação de um grave dilema, relativo a um segredo familiar causador de muito sofrimento durante a vida inteira de uma pessoa. Meu pensamento era de, talvez pela onipotência, própria dos terapeutas, poder ter ajudado a diminuir o sofrimento daquela pessoa que estava ali naquele momento. Por outro ângulo, meu lado mais leigo e humano sentiu uma revolta e uma impotência enormes ao se dar conta da universalidade daquele sofrimento presenciado e imaginando o número de vezes em que ele se repete em tantas famílias cotidianamente. Acabo por concluir, que a obrigatoriedade dos protocolos afetivos (a obrigatoriedade de amar, de conviver e muitas vezes de concordar com aquilo que discordamos) como se refere o autor do texto, ou de outro modo, de acordo com a visão sistêmica, a obrigatoriedade de atender às lealdades invisíveis entre os membros do grupo familiar, instituídas e existentes em todas as famílias através dos laços afetivos, podem consistir em formas, simplesmente, de garantir o pertencimento a algum lugar, de diminuir a sensação de solidão ou de desespero existencial inerente ao ser humano, por mais ambivalência de sentimentos que possa trazer consigo. O que fazer com tanta ambivalência, eis a questão... no fim, creio que cada um vai se virando de acordo com seus próprios recursos, contando um pouco com a sorte talvez, de fazer parte de uma família onde o acaso não seja o fator agregador de maior importância, pelo menos na hora de fazer filhos...